Eu sucumbi ao algoritmo: o caso do vestido da China e o consumo inconsciente
Sim, eu sucumbi à insistência do algoritmo e comprei aquele vestido da China que também ficou piscando nas suas redes sociais. Pior do que isso: minha irmã, tão mais esperta do que eu, caiu no mesmo conto do vigário (se é que existem vigários na China).
E o problema não é o site, ou a decepção de saber que minha irmã é tão falível quanto eu, nem mesmo abrir o embrulho plástico e constatar o óbvio (que um vestido de 20 doletas não pode ser de linho, nem ter um corte decente!), nada disso me abala tanto quanto constatar que eu sucumbi ao algoritmo.
Anos atrás, facilitei um workshop onde compartilhamos nossos piores casos de consumo inconsciente. Na época eu tinha 5 tipos diferentes de rímel. Era uma futilidade sem justificativa, mas algo inocente. Depois disso, os algoritmos se sofisticaram e eu achei que tinha sofisticado meu pensamento sobre consumo… então o caso do vestido da China é uma derrota pessoal.
Juro que parei para pensar! Cheguei a mostrar para a costureira o modelo do vestido (é ano novo, acho que me cairia bem; claro, filha), cheguei a abandonar o carrinho de compras, lembrando daquela história escabrosa da mulher que teria encontrado o bilhete de uma escrava chinesa dentro do pacote; fora o carbono que eu sei que se gasta para trazer algo inútil da China, ou o tecido que eu vou ter que jogar no lixo, ou o tempo da pessoa que trabalhou a toa, sendo escrava, semiescrava ou o que seja, fora alimentar o sorriso no rosto de quem está levando as milhares de 20 doletas das mulheres idiotas que compram os vestidos da China. Grupo ao qual agora pertenço.
Eu sou uma sardinha em um imenso cardume de consumidores digitas que algum tipo de malha programática capta com um só movimento. Pior, eu sabia e mesmo assim sucumbi a uma programação que lê o que eu faço e busco nas redes e foi tão fácil: o carrinho abandonado estava ali como se soubesse que eu voltaria.
Vou ter que ficar cada vez mais esperta. Ainda mais do que a minha irmã, porque o algoritmo é onipresente, onisciente e onienvolvente.
No final, foi tão simples e old fashioned a solução: entrei em um brechó a 1km de casa e comprei um vestido para o ano novo. Conversei com a vendedora, provei, ficou perfeito. Era feito de um ótimo cetim de seda e teve sua última noite de glória. Morreu com um furo de cigarro na manhã do dia primeiro, de tanto dançar. Justificou cada fio, algo jamais vai acontecer ao vestido da China.